Cocktails. Prazer em estado líquido

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“A moda do gin trouxe os destilados novamente para o centro das atenções. O percurso e a visão dos mais influentes barmen portugueses sobre a arte de misturar bebidas

“Estou a tentar dar-lhes alguns mimos que não são muito normais numa feira de bar. Têm uma área mais restrita, com um chef a cozinhar para eles. Tenho um spa para quando acabam as apresentações, com uma menina a fazer massagens para relaxarem. Tenho uns shuttles, que além de os ir buscar, organizam passeios para verem Sintra ou Cascais”. Alberto Pires, mentor do Lisbon Bar Show, explica ao DN como convence a elite mundial do bartending a vir até à capital portuguesa para o evento – pois Lisboa é uma periferia relativamente aos locais onde se vão definindo as tendências do sector (como Londres, Nova Iorque ou Paris).

Durante dois dias, o Pavilhão de Exposições da Tapada da Ajuda transformou-se num gigantesco bar. Fosse o cenário mais retro e de repente poderíamos sentir-nos dentro de um episódio da famosa série televisiva Mad Men, que voltou a colocar os cocktails clássicos no centro das atenções. O perfil do consumidor português, mais atento a este tipo de bebidas, também tem ajudado ao sucesso da feira, que completa esta quarta-feira a sua terceira edição. “O mercado de cocktails está a disparar. Teve uma ajuda desta moda dos gins, mas há uma apetência muito maior para cocktails do que havia há uns tempos. Por exemplo, há cinco anos seria quase impensável realizar este evento cá”, confessa.

Em Portugal existem poucos bares com padrão internacional, mas o país tem alguns dos profissionais mais respeitados do sector. Paulo Figueiredo e Humberto Marques aproveitaram o evento para regressar ao cantinho de onde partiram há muito para evoluir na profissão de bartending. Humberto abriu em 2015 o seu primeiro espaço, o Curfew (Dinamarca). “Sempre trabalhei com chefs, daí a minha inspiração e conhecimento de como os sabores trabalham uns com os outros. É o que faço no meu bar em Copenhaga. Baseio-me nos sabores e nas suas ligações. O que se faz hoje em dia em bar é tirar um pouco das ideias dos chefs e metê-las em líquido. Sem dúvida que a cozinha, cada vez mais, ajuda a que as pessoas também apreciem a parte líquida”, explica.

Paulo queria ser professor de educação física mas uma oportunidade para entrar na Escola de Hotelaria de Coimbra trocou-lhe as voltas. Não tinha um plano. Em 2004 chegou a Londres, onde trabalhou com alguns dos nomes mais conhecidos do meio. “Só então a paixão se tornou em amor e percebi a dimensão deste mundo, onde se pode fazer tanta coisa. Aí casei-me oficialmente pela profissão”. Agora viaja mais de 40 semanas por ano, maioritariamente pelas Caraíbas e América Latina, onde é embaixador da Diageo (maior companhia de destilados do mundo), dá formação e faz de júri em competições de bartending. “Hoje em dia as pessoas trabalham com arquitetos, engenheiros, a estudar o impacto da luz na experiência de um cliente, ou o copo. Estamos a explorar sabores mais do que nunca, dietas sem açúcar… Acho que a cozinha e o bar vão de mão em mão. A grande verdade é que aprendemos quase tudo dos chefs, mesmo que não queiramos assumir”, diz.

Aos 15 anos Humberto foi do Caramulo até S. Pedro de Moel para trabalhar em bares de praia. Tinha um plano na cabeça. Que o levaria para fora do país, pois a criatividade no bartending “estava muito parada cá, desde os anos 60 e 70”. Passou pela Escócia, onde aprendeu tudo o que podia sobre uísque, e trabalhou com um chef famoso. Mas as origens nunca se esquecem, e Lisboa é um ótimo local para as relembrar. “Sempre tentei usar ingredientes portugueses. Um dos primeiros cocktails que criei na Escócia trouxe um ingrediente que nunca tinha sido utilizado: eucalipto. Lembro-me que quando estava constipado a minha mãe fazia-me um xarope de eucalipto com as folhas. Então tive a ideia ‘porque não fazer um xarope de eucaliptos e misturar com gin?’ Há mais ingredientes que uso, como as folhas de mimosa que surgem no Norte em março e abril, ou a folha de louro”.

O fundador do Curfew mostra-se satisfeito pelo crescimento da indústria em Portugal. “Este tipo de eventos ajuda imenso, mas ainda está muito atrasada. O português está a chegar lá, a apreciar a qualidade das bebidas espirituosas”. Talvez por isso, confessa, não põe de parte a possibilidade de um dia abrir um bar em Portugal. Paulo também nota diferenças nos portugueses, um público “mais educado” e que, espera, comece “a sair da febre do gin tónico”. “Não tenho nada contra a bebida, mas foi demasiado e matou várias categorias e oportunidades. Há ocasiões para tudo. Mas Lisboa está com uma dinâmica fenomenal e temos ótimos produtos”, garante.”

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Fonte: Diário de Noticias

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