Um bar de gin é um bar como os outros, só que em vez de garrafas tem especiarias Margão.
Se, nas bodas de Caná, em vez de avisar Jesus que já não havia vinho, Maria tivesse antes dito: “Não têm gin! E o cardamomo está quase a acabar!”, o mundo seria diferente. O Messias faria o milagre. O servo diria ao noivo: “Toda a gente serve primeiro gin seco, e só depois serve o floral. Tu, porém, guardaste o melhor para o fim”. E Jesus interviria: “É bom, não é? Carreguei no zimbro. E na 2ª destilação dei um cheirinho de coentros. Isto vai bem com pepino e orégãos. Já agora, há por aí um calhau que eu possa transformar em pão sem glúten?” E o cristianismo não seria uma religião, seria uma tendência.
Não valeria a pena Cristo dar a vida para salvar esta humanidade que consome uma bebida que parece um centro de mesa e demora mais tempo a ser servida do que a ser ingerida? Aliás, a haver um problema logístico, nunca seria com o gin. A pedir alguma coisa, Maria pediria a Jesus para transformar água em barmen, para despacharem gins tónicos mais depressa. (Digo barmen para facilitar. Na verdade, são decoradores de mini-aquários).
É por isso que, se o Governo quer proteger a saúde dos portugueses, não se pode limitar a aumentar o imposto sobre bebidas alcoólicas. Tem de taxar tudo o que envolve o consumo de gin. Estar num bar a beber acicata a cirrose, mas estar num bar de gin à espera para ser atendido é trágico para a saúde mental. O que faz mal não é o consumo de álcool em excesso. É o consumo de tempo em excesso antes de podermos sequer consumir álcool em excesso. Num bar de gins, ressaca-se entre cada copo. Já agora, para quem não sabe, um bar de gin é um bar como os outros, só que em vez de garrafas lá atrás tem uma prateleira de especiarias da Margão. Por causa do gin, já há bêbados a rondarem ervanárias.
Hoje, pedir um gin tónico é espoletar um processo muito complexo. É o equivalente a pedir um copo de vinho e o barman dizer: “Vou então principiar as vindimas”. A diferença é que, para nos explicar o vinho há um escanção e para nos explicar um gin tónico é preciso uma cozinheira com boa mão para temperos. Há dias, num restaurante, disse ao empregado: “Tomilho, alcaçuz e manjericão? Este lombo de porco deve ser saboroso”. E ele: “Não é lombo de porco. Isso é o nosso menu de gins”.
Portanto, se o Governo quer arrecadar uma boa maquia, deve taxar a pimenta, a noz moscada, o cravinho, a canela, o gengibre e o açafrão. 500 anos depois, as especiarias podem voltar a ser fonte de riqueza. Embora ache que se Vasco da Gama desconfiasse que estava a ir buscar ingredientes para cocktails, tinha encostado nas Berlengas e ficava por lá.
Felizmente, os gins tónicos de antanho eram mais simples. Se tivessem sido sempre assim, o Império Britânico não tinha existido: os ingleses teriam sido dizimados pela malária antes de as bebidas estarem prontas.
MARTE, A TAXA
A sonda Schiparelli já chegou a Marte, mas ainda não há sinais de vida. É natural. Se chega uma visita a fazer muito barulho à minha porta, eu também finjo que não estou em casa. Também é possível que se esteja a procurar mal. Os engenheiros que coordenam a missão são profissionais, mas para descobrir sinais de vida escondidos, o melhor é enviar alguém da Autoridade Tributária portuguesa. Se houver marcianos a interagirem entre si, os fiscais vão descobrir o mínimo indício de actividade económica passível de ser taxada. São perdigueiros de tributos.
O STÔR MÁRIO NOGUEIRA FARÁ BABYSITTING?
Na terça-feira a minha casa foi invadida por 12 crianças. Havia greve de funcionários no liceu delas e o meu enteado trouxe-as para aqui. Achei que tinham sido os cortes malvados da troika, mas a troika já partiu. Portanto, ou os funcionários são preguiçosos, ou os alunos são abusadores que têm o topete de quererem aulas todos os dias.
Agora, como não dá aulas e como o sindicato parece estar a atravessar uma temporada de acalmia, sem razões para protestar, peço a Mário Nogueira que para a próxima venha fazer babysitting.
NÃO HÁ FOME QUE NÃO DÊ EM PARVOÍCE
A Fertagus lançou uma campanha inovadora que procura sensibilizar os seus passageiros para o facto de haver quem desmaie por estar em jejum, provocando atrasos nos comboios. Só que, se numa campanha contra a fome se pedem donativos ou géneros alimentícios, na campanha da Fertagus pede-se a quem passa fome para, por obséquio, não passar. Em vez de apelar ao sentido de decência de quem pode ajudar, apela-se ao sentido de decência de quem precisa de ajuda, mas não devia. Porque já não é fome, é falta de respeito. Uma espécie de larica pouco cívica.
É o mesmo que a letra do We Are The World passar a ser: ‘Ei, etíopes! Alimentem-se, pá. Essas imagens de bebés desfalecidos, com barrigas proeminentes e moscas nos olhos, são desagradáveis para nós. Vejam lá isso, se fazem favor’.
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